Condomínios passam a ter as mesmas obrigações de uma grande empresa em programa do Governo Federal que padroniza informações e deixa no passado velhos hábitos de informalidade
* José Roberto Graiche Júnior
Atualizar documentos de dependentes, cadastrar autônomos e gerenciar dados de segurança do trabalho estão entre os maiores desafios para se adequar ao eSocial. O sistema não altera a lei e não impõe novas exigências, mas cria um novo sistema de autofiscalização que exigirá mais planejamento e transparência na gestão do condomínio. Precisando cortar custos com funcionários e arrecadar mais, o governo passa a delegar às administradoras o papel de unificar e reportar eletronicamente as obrigações fiscais, previdenciárias e trabalhistas. Os condomínios ainda não possuem personalidade jurídica, mas precisam se preparar para cumprir as mesmas obrigações de uma grande empresa.
Desde o início do ano passado, administradoras de todo Brasil vêm adaptando as rotinas de trabalho à realidade automatizada do eSocial. Foi necessário atualizar os sistemas internos com softwares mais modernos e velozes na transmissão de dados. Algumas até criaram cartilhas com os novos procedimentos e oferecem cursos para síndicos e zeladores, preparando-os para as novas exigências.
Até agora percorremos duas etapas do eSocial. A primeira exigiu o cadastro de empregadores até o dia 30 de agosto. Já na segunda etapa foi necessário cadastrar empregados, autônomos e síndicos no prazo limite de 30 de outubro. Uma grande administradora de São Paulo chegou a contratar uma auditoria interna para simular a transmissão de dados das duas primeiras etapas. A auditoria, que avaliou o cadastro de 4 mil funcionários em 700 condomínios, apontou 65 mil dados incorretos ou incompletos. O resultado não necessariamente indica desorganização da administradora, mas revela que não será fácil reunir todos os dados exigidos pelo governo.
O sucesso dos condomínios no cumprimento dos prazos depende de uma boa relação com zeladores e gerentes prediais, pessoas diretamente ligadas ao dia a dia dos funcionários. São eles quase sempre os primeiros a saber quando um empregado precisa alterar informações de sua ficha cadastral. Para facilitar a comunicação e não depender de trocas de correspondências, algumas administradoras criaram até grupos de whatsapp com os zeladores.
O cadastro de funcionários
Atualizar o cadastro de empregados é uma das etapas mais árduas para cumprir as exigências do eSocial. A obrigatoriedade de fornecer o CPF para o cadastro de todos os dependentes é o principal desafio, já que muitas crianças ligadas aos funcionários ainda não possuem o documento. Muitos empregados sequer residem na mesma cidade dos dependentes, o que dificulta ainda mais para tirar o documento a tempo. Outro ponto de atenção é que, a partir de agora, um dependente só pode estar vinculado a um único empregado. Ou seja, um filho só pode ser dependente do pai ou da mãe, jamais dos dois ao mesmo tempo, como acontecia anteriormente.
É necessário ainda disponibilizar dados do cônjuge, como cartão do SUS e RG, além de documentos dos filhos, como certidão de nascimento e carteira de vacinação. Para atender com antecedência o prazo de envio das informações de empregados, administradoras já destinaram aos trabalhadores formulários de recadastramento para validar e complementar dados que ainda não possuem, como o CPF de filhos e do cônjuge.
O envio informatizado dos dados também provocará mudanças na admissão e registro de novos empregados. Candidatos aprovados em um processo seletivo não poderão iniciar um contrato de trabalho sem antes compartilhar os documentos pessoais e de seus dependentes. Condomínios que costumavam autorizar temporariamente o ingresso de funcionários na falta de algum documento vão precisar abandonar esse tipo de informalidade.
O eSocial impacta ainda na contratação de trabalhadores autônomos. Jardineiros, pintores, encanadores e outros profissionais sem vínculos empregatícios precisarão preencher e assinar um formulário para oficializar a prestação do serviço. A ficha cadastral exige o fornecimento de dados pessoais, como PIS, CPF, RG, endereço e nome dos pais. A sugestão é que os condomínios condicionem o pagamento pelo serviço ao preenchimento do formulário. Se o trabalhador vai embora sem fornecer alguns dados, o condomínio ficará irregular caso não consiga localizá-lo depois.
Padronizar o envio das informações por meio do eSocial pode render benefícios em médio e longo prazos para funcionários e empresas, como a diminuição de fraudes, inconsistências de informações e irregularidades. Até lá fazemos o possível para usar os recursos que temos a nosso favor. É um período de aprendizado, tanto para nós quanto para o governo.
* Presidente da Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC)